Antônio Pereira- Jornalista e escritor – Uberlândia – MG
Nos primeiros meses de 1961, chegou a Uberlândia o radialista Altamirando Dantas Ruas, uma das vozes mais bonitas do rádio brasileiro. Assumiu a Direção Artística da Rádio Educadora do conhecido empresário e coronel político Nicomedes Alves dos Santos.
Para aqueles que não conheceram seu timbre vocal, basta dizer-lhes que sua entrada para o rádio carioca, onde estavam as melhores emissoras do país, se fez através de concurso do qual participaram uma centena e meia de candidatos, entre eles, Sílvio Santos, Sargentelli e Cid Moreira. Dantas me contou que esse concurso se deu em 1948, mas já li que foi em 46.
Começou na Bahia, aos 16 anos. Seu primeiro emprego, no Rio, foi na Rádio Mairinck Veiga, depois ou por algumas das suas mais famosas emissoras: Guanabara, Mundial (Globo), Nacional e outras. Foi o primeiro radialista a realizar shows em cinema no Rio de Janeiro e teve seu nome batizando um personagem pilantra do Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto – que era seu amigo), o Primo Altamirando.
Chegou a Uberlândia e aqui ficou por obra do destino, pois seu objetivo era organizar uma emissora em Araguari. Ele já estava em Araguari e precisava voltar ao Rio. Como o avião que tomaria não pôde descer naquela cidade por falta de teto ele veio de automóvel para Uberlândia, mas aqui a chuvarada era imensa. Teve que pernoitar aqui. Nessa rápida estada, um amigo convidou-o a ficar e cuidar da parte artística da Rádio Educadora. Ele ficou.
Atuou na Educadora, na Difusora, nas TVs Triângulo e Paranaíba, nos jornais “A Notícia”, “O Triângulo” e “Correio de Uberlândia”.
Tive a honra de merecer sua atenção. Fui entrevistado por ele num programa cultural da TV-Triângulo e destacado numa crônica da série “Eu Destaco Você”, lida em rádio e publicada em jornal.
Foi político, eleito Vereador por duas vezes, mas, a bem da verdade, nunca percebi em sua conversa, em seus escritos, qualquer entusiasmo partidário.
Praticou a literatura sem muito alarde. Publicou dois livros: “Sorriso da Inocência” (crônicas) e “Bazar de Sonhos” (crônicas e poemas). Gravou um LP de crônicas e teve um monólogo representado por Edy Santos no Uberlândia Clube, em 1962, “É tão pouco o que peço”, sob a direção de Remy França.
Dantas sonhava com um automóvel, mas só pretendia comprá-lo quando tivesse sua Carteira de Motorista. Em 1964, conseguiu. De posse do documento, foi a Autominas e conversou com Mário Pinto, um português que era sócio da distribuidora de fuscas na cidade.
Escolhido o veículo veio a negociação. Dantas só podia comprar a prestações – como todo intelectual. Mário concordou em vender-lhe a prazo, mas queria um bom avalista.
Fácil, Dantas não era apenas empregado do Nicomedes, era-lhe também amigo. E quem recusaria esse aval? Pediu ao Mário que esperasse um pouco, ia buscar o avalista. Procurou o patrão. Quando pediu o aval, Nicomedes recuou e foi enfático:
– Olha, Dantas. Aval não dou nem para os meus filhos!
Um tanto surpreso, um tanto magoado, Dantas engoliu a resposta do amigo e foi para casa acabrunhado.
Aquela recusa amargurara-lhe o dia. Eram tão amigos. Cumpriu sua tarefa radiofônica normalmente. Escreveu a crônica diária, quadro infalível em todas as emissoras de qualidade. Leu-a com seu vozeirão suave e sensível e recolheu-se aborrecido.
No dia seguinte, logo de manhã, Mário Pinto telefonou:
– Como é, Dantas? Você não voltou mais. Não vai querer o carro?
– Querer eu quero, mas…
Engoliu em seco revivendo a decepção:
– … não consegui avalista…
– Avalista pra quê? O carro tá aqui à sua espera. Pago e ado pro seu nome.
Dantas correu lá. Nicomedes tinha comprado o carro para ele.
(Fonte: Dantas Ruas, Luiz Fernando Quirino, revista Via de Expressão)
Gosto de ler suas histórias, são realmente interessantes. O assunto é bom e a maneira de contar é agradável, bem escrita e chama a atenção. Às vezes penso que os personagens (reais) de suas histórias são bem mais inusitados e noticiáveis do que qualquer outro da época atual. De acordo com sua interpretação, a história de Uberlândia é digna de ser contada e recontada.Muita sorte desta cidade ter um escritor que faça isto!